Animais que morrem...
Man with Dog by Francis Bacon
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Pensamos diferir dos outros animais por podermos encarar a perspectiva das nossas mortes, quando não sabemos mais do que eles o que a morte traz consigo. Tudo nos diz que a morte significa a extinção, mas não somos capazes de imaginar o que isso queira dizer. A verdade é que não tememos a passagem do tempo porque sabemos que a morte existe. Tememos a morte porque resistimos à passagem do tempo. Se outros animais não a temem como nós, não é porque nós saibamos alguma coisa que eles não sabem. É porque não são oprimidos pelo tempo.
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Uma das poucas passagens em que vemos um autor europeu escrever que as mortes dos seres humanos não são diferentes das dos outros animais aparece assinada por Bernardo Soares.
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"Se considero com atenção a vida que os homens vivem, nada encontro nela que a diferencie da vida que vivem os animais. Uns e outros são lançados inconscientemente através das coisas e do mundo; uns e outros se entretêm com intervalos; uns e outros percorrem diariamente o mesmo percurso orgânico; uns e outros não pensam para além do que pensam, nem vivem para além do que vivem.
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O gato espoja-se ao Sol e dorme ali. O homem espoja-se à vida, com todas as suas complexidades, e dorme ali. Nem um nem outro se liberta da lei fatal de ser como é."
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"Bernardo Soares" foi uma das múltiplas identidades imaginadas que o grande escritor português Fernando Pessoa assumiu. Certas verdades não podem ser ditas a não ser como ficção.
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John Gray
(in Sobre Humanos e Outros Animais)
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