Wednesday, July 26, 2006

My name


Lhasa
"
"
Why don’t you ask me
How long i’ve been waiting
Set down on the road
With the gunshots exploding
I’m waiting for you
In the gloom and the blazing
I’m waiting for you
I sing like a slave i know
I should know better
I’ve learned all my lessons
Right down to the letter
And still i go on like this
Year after year
Waiting for miracles
And shaking with fear
...
Why don’t you answer
Why don’t you come save me
Show me how to use
All these things
That you gave me
Turn me inside out
So my bones can save me
Turn me inside out
...
You’ve come this close
You can come even closer
The gunshots get louder
And the world spins faster
And things just get further
And further apart
The head from the hands
And the hands from the heart
...
One thing that’s true
Is the way that i love him
The earth down below
And the sky up above him
And still i go on like this
Day after day
Still i go on like this
...
Now i’ve said this
I already feel stronger
I can’t keep waiting for you
Any longer
I need you now
Not someday
When i’m ready
Come down on the road
Come down on the road
...
My name my name
Nothing is the same
I won’t go back
The way i came
"
"
"

Friday, July 21, 2006

Aforismos



«A vida é a hesitação entre uma exclamação e uma interrogação.
Na dúvida, há um ponto final.»

(Bernardo Soares / Fernando Pessoa)

Wednesday, July 19, 2006

Aprendiz de Viajante

Al Berto

"Um dia li num livro: «Viajar cura a melancolia».

Creio que, na altura, acreditei no que lia. Estava doente,

tinha quinze anos. Não me lembro da doença que me levara

à cama, recordo apenas a impressão que me causara, então,

o que acabara de ler.

Os anos passam - como se apagam as estrelas cadentes

- e, ainda hoje, não sei se viajar cura a melancolia. No

entanto, persiste em mim aquela estranha impressão de que

lera uma predestinação.

A verdade é que desde os quinze anos nunca mais parei

de viajar. Atravessei cidades inóspitas, perdi-me entre mares

e desertos, mudei de casa quarenta e quatro vezes e conheci

corpos que deambulavam pela vasta noite... Avancei sempre,

sem destino certo.

Tudo começou a seguir àquela doença.

Era ainda noite fechada. Levantei-me e parti. Fui em

direcção ao mar. Segui a rebentação das ondas, apanhei

conchas, contornei falésias; afastei-me de casa o mais que

pude. Vi a manhã erguer-se, branca, e envolver uma ilha;

vi crepúsculos e noites sobre um rio, amei a existência.

Dormia onde calhava: no meio das dunas, enroscado

no tojo, como um animal; dormia num pinhal ou onde me

dessem abrigo, em celeiros, garagens abandonadas, uma

cama...

E quando regressei, regressei com a ânsia do eterno

viajante dentro de mim.

Hoje sei que o viajante ideal é aquele que, no decorrer

da vida, se despojou das coisas materiais e das tarefas

quotidianas. Aprendeu a viver sem possuir nada, sem um

modo de vida. Caminha, assim, com a leveza de quem

abandonou tudo. Deixa o coração apaixonar-se pelas

paisagens enquanto a alma, no puro sopro da madrugada,

se recompõe das aflições da cidade.

A pouco e pouco, aprendi que nenhum viajante vê o

que outros viajantes, ao passarem pelos mesmos lugares,

vêem. O olhar de cada um, sobre as coisas do mundo, é

único, não se confunde com nenhum outro.

Viajar, se não cura a melancolia, pelo menos, purifica.

Afasta o espírito do que é supérfluo e inútil; e o corpo

reencontra a harmonia perdida - entre o homem e a terra.

O viajante aprendeu, assim, a cantar a terra, a noite e

a luz, os astros, as águas e a treva, os peixes, os pássaros

e as plantas. Aprendeu a nomear o mundo.

Separou com uma linha de água o que nele havia de

sedentário daquilo que era nómada; sabe que o homem

não foi feito para ficar quieto. A sedentarização

empobrece-o, seca-lhe o sangue, mata-lhe a alma -

estagna o pensamento.

Por tudo isto, o viajante escolheu o lado nómada da

linha de água. Vive ali, e canta - sabendo que a vida não

terá sido um abismo, se conseguir que o seu canto, ou

estilhaços dele, o una de novo ao Universo."

Al Berto, in O Anjo Mudo

Monday, July 10, 2006

Arte poética

José Luís Peixoto
"o poema não tem mais que o som do seu sentido,
a letra p não é a primeira letra da palavra poema,
o poema é esculpido de sentidos e essa é a sua forma,
poema não se lê poema, lê-se pão ou flor, lê-se erva
fresca e os teus lábios, lê-se sorriso estendido em mil
árvores ou céu de punhais, ameaça, lê-se medo e procura
de cegos, lê-se mão de criança ou tu, mãe, que dormes
e me fizeste nascer de ti para ser palavras que não
se escrevem, lê-se país e mar e céu esquecido e
memória, lê-se silêncio, sim, tantas vezes, poema lê-se silêncio,
lugar que não se diz e que significa, silêncio do teu
olhar de doce menina, silêncio ao domingo entre as conversas,
silêncio depois de um beijo ou de uma flor desmedida, silêncio
de ti, pai, que morreste em tudo para só existires nesse poema
calado, quem o pode negar?, que escreves sempre e sempre, em
segredo, dentro de mim e dentro de todos os que te sofrem.
o poema não é esta caneta de tinta preta, não é esta voz,
a letra p não é a primeira letra da palavra poema,
o poema é quando eu podia dormir até tarde nas férias
de verão e o sol entrava pela janela, o poema é onde eu
fui feliz e onde eu morri tanto, o poema é quando eu não
conhecia a palavra poema, quando eu não conhecia a
letra p e comia torradas feitas no lume da cozinha do
quintal, o poema é aqui, quando levanto o olhar do papel
e deixo as minhas mãos tocarem-te, quando sei, sem rimas
e sem metáforas, que te amo, o poema será quando as crianças
e os pássaros se rebelarem e, até lá, irá sendo sempre e tudo.
o poema sabe, o poema conhece-se e, a si próprio, nunca se chama
poema, a si próprio, nunca se escreve com p, o poema dentro de
si é perfume e é fumo, é um menino que corre num pomar para
abraçar o seu pai, é a exaustão e a liberdade sentida, é tudo
o que quero aprender se o que quero aprender é tudo,
é o teu olhar e o que imagino dele, é solidão e arrependimento,
não são bibliotecas a arder de versos contados porque isso são
bibliotecas a arder de versos contados e não é o poema, não é a
raiz de uma palavra que julgamos conhecer porque só podemos
conhecer o que possuímos e não possuímos nada, não é um
torrão de terra a cantar hinos e a estender muralhas entre
os versos e o mundo, o poema não é a palavra poema
porque a palavra poema é uma palavra, o poema é a
carne salgada por dentro, é um olhar perdido na noite sobre
os telhados na hora em que todos dormem, é a última
lembrança de um afogado, é um pesadelo, uma angústia, esperança.
o poema não tem estrofes, tem corpo, o poema não tem versos,
tem sangue, o poema não se escreve com letras, escreve-se
com grãos de areia e beijos, pétalas e momentos, gritos e
incertezas, a letra p não é a primeira letra da palavra poema,
a palavra poema existe para não ser escrita como eu existo
para não ser escrito, para não ser entendido, nem sequer por
mim próprio, ainda que o meu sentido esteja em todos os lugares
onde sou, o poema sou eu, as minhas mãos nos teus cabelos,
o poema é o meu rosto, que não vejo, e que existe porque me
olhas, o poema é o teu rosto, eu, eu não sei escrever a
palavra poema, eu, eu só sei escrever o seu sentido."
José Luís Peixoto, in a criança em ruínas